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Ideal Axadrezado #010 - Entre o Colapso no Relvado e a Continuada Agonia das Modalidades

Ideal Axadrezado #010 - Entre o Colapso no Relvado e a Continuada Agonia das Modalidades
O vazio que ecoa mais alto que qualquer comunicado: símbolo do abandono que se estende no Boavista Futebol Clube

Quando às 20h15 de uma terça-feira cinzenta o árbitro Carlos Macedo iniciou o encontro entre Boavista e Gil Vicente, ainda havia uma ténue esperança que pairava sobre o Estádio do Bessa. Três golos de Pablo de rajada e 90 minutos depois, essa esperança transformou-se numa certeza dolorosa: a caída parece agora inevitável.

Perante cerca de 5 mil adeptos, recebemos o Gil Vicente num confronto direto fundamental para as nossas aspirações de manutenção. Lito Vidigal, procurando uma reação após várias derrotas consecutivas, surpreendeu adotando um sistema 4-3-3, com Pérez, Van Ginkel, Reisinho e Vukotic formando um losango no meio-campo.

O primeiro tempo foi marcado pela contenção de ambos os lados. Apesar de cedermos o controlo de bola aos galos, conseguimos manter a organização defensiva, com Abascal e Fogning seguros na contenção dos ataques adversários. A nossa única oportunidade clara surgiu através de Kurzawa, cujo cruzamento encontrou Koné na área, mas Andrew negou-nos a vantagem com uma defesa a dois tempos. Muito pouco para quem tinha a obrigação de ganhar.

O equilíbrio táctico que marcou os primeiros 45 minutos desmoronou-se logo após o intervalo. O que viria a acontecer em apenas dez minutos da segunda parte seria um autêntico pesadelo em câmara lenta. César Peixoto ajustou o posicionamento dos seus jogadores e, aos 55 minutos, na sequência de um canto, Pablo aproveitou uma desatenção coletiva para finalizar ao primeiro poste. O treinador Lito Vidigal ainda pedia por "concentração" quando, 60 segundos depois, o mesmo Pablo voltou a fazer abanar as redes da nossa baliza num lance de total desorganização defensiva.

A descrença instalou-se nas bancadas. Os adeptos, que tinham recebido a equipa com cânticos de apoio horas antes do jogo, olhavam incrédulos para o relvado enquanto os fantasmas da descida se materializavam em forma de golos adversários. A reação desesperada que se seguiu foi tão descoordenada quanto ineficaz. Lito Vidigal, num movimento incompreensível, substituiu Kone por Lystsov quando já perdíamos por dois golos, optando por reforçar a defesa em vez de arriscar no ataque.

A sentença final seria carimbada pelo mesmo carrasco: Pablo completou o hat-trick aos 65 minutos, tornando-se no símbolo perfeito da nossa tragédia. A frustração coletiva explodiu aos 80 minutos, quando Tidjany Touré foi expulso por provocar os adeptos boavisteiros, gerando momentos de grande tensão entre jogadores e bancadas. Steven Vitória, que chegou há pouco tempo, foi o único a demonstrar algum carácter ao defender a honra do xadrez, mesmo que isso lhe tenha custado também um cartão vermelho.

O golo de penálti convertido por Bozenik no último minuto de jogo foi apenas um pálido consolo numa noite para esquecer. O resultado de 1-3 reflete não apenas a superioridade do Gil Vicente neste jogo, mas também todas as fragilidades estruturais que têm minado a nossa época.

Individualmente, poucos escapam à crítica. Vaclik, habitualmente seguro, nada pôde fazer perante a desorganização defensiva. No meio-campo, Vukotic confirmou ser uma sombra do jogador que já foi, enquanto Van Ginkel continua sem conseguir influenciar o jogo a partir da posição de extremo onde tem sido incompreensivelmente utilizado. Sidoine Fogning foi talvez o único que esteve em bom plano até o colapso coletivo.

Se a primeira parte demonstrou alguma organização, a entrada desastrosa na segunda metade revelou todos os problemas que nos têm afligido: falta de liderança em campo, ausência de reação às adversidades e decisões técnicas questionáveis. Como se não bastasse o futebol apresentado, o clima nos últimos minutos do jogo, com a expulsão de Touré por provocações e a resposta de Steven Vitória, traduziu perfeitamente o desespero que tomou conta de todos.

Este resultado deixa-nos cada vez mais isolados na zona de descida, com sete jogos pela frente e uma diferença pontual que exigiria agora um milagre maior do que o do ano passado para assegurar a manutenção. César Peixoto, treinador do Gil Vicente, resumiu bem a situação ao afirmar que "ganharam uma equipa hoje", enquanto do nosso lado, o silêncio de Lito Vidigal no final da partida disse mais do que qualquer declaração poderia dizer.

O futuro? A matemática ainda não nos condena oficialmente, mas a realidade é implacável. As reações dos adeptos nas redes sociais e nas bancadas no final do jogo já apontam para uma resignação dolorosa. Depois de várias épocas a fugir por entre os pingos da chuva, parece que desta vez não haverá escape. Se há algo que resta a esta equipa é tentar terminar a temporada com a dignidade que tem faltado nos últimos jogos.

A preocupação maior, contudo, vai além da descida desportiva. As palavras de alguns adeptos que abandonaram o estádio antes do final do jogo pela primeira vez em décadas, falam de um receio profundo: o fantasma de que esta descida possa significar não apenas a queda queda da I Liga, mas talvez o fim de uma instituição centenária tal como a conhecemos.

Por enquanto, resta-nos cumprir o calendário e continuar a lutar até ao fim. Para o adepto axadrezado, a dor da derrota apenas se compara à incerteza do que virá a seguir. Sabemos bem que o Boavista é feito de ressurreições improváveis, mas este parece ser o golpe mais duro dos últimos anos.


O Silêncio que Mata o Clube: Quanto Tempo Mais Vamos Tolerar o Intolerável?

Mais um comunicado, mais um grito no deserto.

O departamento de futsal do Boavista FC lançou um novo apelo desesperado que vem apenas confirmar o que já sabíamos: a crise estrutural no nosso clube continua a aprofundar-se, enquanto nós, boavisteiros, assistimos de camarote.

Não é novidade para ninguém. Não é surpresa. Não é um evento isolado.

É apenas mais um capítulo na longa narrativa de promessas quebradas, de expectativas frustradas e de gestão inadequada que tem caracterizado o nosso amado clube nos últimos anos.

A passividade mata. O silêncio mata. E, infelizmente, o Boavista Futebol Clube tem sido mestre em ambos desde há muito tempo.

Para Além do Futebol Profissional

O Boavista não é apenas a equipa principal de futebol. É um universo de modalidades que, durante décadas, carregaram o símbolo axadrezado com orgulho e dedicação. Modalidades que trouxeram títulos, prestígio e formaram gerações de atletas, cidadãos e adeptos.

O futsal é apenas uma entre muitas modalidades que hoje lutam pela sobrevivência, não contra adversários desportivos, mas contra a indiferença interna e a falta de recursos básicos para o seu funcionamento.

Três meses sem verbas operacionais. Pavilhões perdidos para treinos. Ausência de respostas. É este o cenário actual descrito pelos responsáveis do futsal, ecoando o que já tinha sido denunciado há semanas pelas diversas modalidades do clube.

Responsabilidade Partilhada

É fácil, talvez até confortável, apontar o dedo exclusivamente à direção actual. Mas não seria honesto.

A verdadeira responsabilidade é partilhada por todos nós que permitimos, ano após ano, que esta cultura de gestão amadora e imediatista continue a prevalecer no nosso clube. Somos todos cúmplices quando permitimos que os padrões de exigência e transparência sejam continuamente baixados.

Uma direção não governa no vácuo. Governa com o consentimento tácito ou explícito dos associados. E nós, boavisteiros, temos sido demasiado tolerantes, demasiado pacientes, demasiado compreensivos.

O Momento da Verdade

Chegámos a um ponto de inflexão. Ou exigimos uma verdadeira mudança de paradigma na gestão do clube, ou assistiremos à lenta agonia de uma instituição centenária que faz parte da nossa identidade coletiva.

Não bastam mais comunicados. Não bastam mais promessas. Não bastam mais desculpas.

Precisamos de acção. Precisamos de um plano estratégico real e executável. Precisamos de uma gestão profissional, transparente e responsável.

E, acima de tudo, precisamos de boavisteiros que não se resignem, que não aceitem o mínimo, que exijam o melhor para o seu clube.

Um Apelo Final

O comunicado do departamento de futsal termina com um apelo para que "este comunicado desperte consciências". Mas quantos comunicados mais serão necessários? Quantos apelos mais teremos de ouvir?

O verdadeiro despertar tem de vir de dentro de cada um de nós. Tem de traduzir-se em participação ativa na vida do clube. Tem de manifestar-se na exigência constante de prestação de contas. Tem de materializar-se na responsabilização daqueles que nos gerem.

Ser boavisteiro não é apenas vestir a camisola nos dias de jogo. É defender os valores e a integridade do clube todos os dias. É garantir que o Boavista FC seja gerido com o respeito que a sua história e os seus adeptos merecem.

O futuro do nosso clube está em nossas mãos. A questão que fica é: que Boavista queremos? E, mais importante ainda, que Boavista estamos dispostos a construir?


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